Auditoria sempre foi um tema que me despertou muito interesse, desde os tempos da faculdade. Foi na auditoria que iniciei a minha carreira profissional.
Me lembro, dos meus tempos de “pica pau”, apelido dado aos auditores quando estão iniciando suas carreiras, que a cada trabalho a busca para encontrar irregularidades era frenética, o desapontamento era enorme quando não se encontrava nada, era quase inadmissível constatar que num determinado processo analisado não fosse identificada nenhuma irregularidade. Com o tempo, a experiência aumenta e se percebe exatamente o contrário, bons são aqueles resultados que apresentam fatos positivos, que evidenciam a existência de um bom controle interno, com procedimentos de segregação de funções claramente definidos; procedimentos com início, meio e fim claramente desenhados; procedimentos sendo executados em conformidade com o regimento interno e legislação pertinente, ou seja quando você identifica a existência da adoção de Governança e Compliance (veja nosso artigo sobre esse tema).
Mais ainda hoje, passados mais de 35 anos que iniciei minhas atividades como auditor, o conceito que a grande maioria das pessoas têm é de que uma auditoria só é necessária quando da desconfiança da existência da prática de uma possível irregularidade.
Muito comum em condomínios quando da troca de gestão de síndicos haver a suspeição da prática de irregularidades da gestão anterior e nesse momento surge a necessidade da contratação de uma auditora para validar o que foi feito. Agora, em momento algum se pensou na necessidade de se ter uma auditoria preventiva permitindo que aquele processo de troca de gestão transcorresse da forma mais natural e transparente possível.
Vale destacar que a gestão sob suspeita atuou a frente do Condomínio por um período de 02 anos; que teve seus processos registrados mensalmente por uma Administradora de Condomínio, em princípio independente do Síndico e mais que isso, tinha um Conselho Fiscal, legitimamente eleito em Assembleia, cuja atribuição principal era fiscalizar as prestações de contas mensais do Síndico e da Administradora.
Então vem as questões: se tínhamos um Síndico fazendo a gestão; tínhamos uma Administradora registrando todos os processos e um Conselho que fiscalizava tudo mensalmente, por que da desconfiança? Por que da necessidade de se contratar uma auditoria só no momento da troca? Por que não se levantou suspeitas durante a gestão e só na sua troca?
A resposta é simples, o despreparo do Síndico em fazer com que seus atos fossem transparentes com processos claramente definidos e comunicados ao Condomínio; o despreparo do Conselho que na sua grande maioria se limita a fiscalizar se para cada despesa existe o respectivo comprovante – cara crachá – o desinteresse dos Condôminos em querer saber como andam as prestações de contas exigindo receber mensalmente, formalmente, os pareceres do Conselho Fiscal recomendando ou não a aprovação das contas analisadas e por fim a qualidade do trabalho da Administradora ao apresentar os registros do que foi feito sem, no entanto, incluir algumas ferramentas de análise evolutiva das principais contas.
Por outro lado, o que é mais comum, é a aprovação das contas anuais a base da “baciada”, o Síndico numa Assembleia com apenas um gráfico mostrando a variação das contas tem toda a prestação de contas, de 12 meses, aprovadas em questão de minutos.
É diante desses cenários que o papel da auditoria, quando bem contratado, é de suma importância.
Primeiro precisamos entender o que de fato é uma auditoria e suas variedades.
O que é Auditoria?
É uma análise criteriosa e detalhada das diversas atividades desenvolvidas e registradas de uma empresa e seus diversos departamentos. Seu objetivo e certificar-se de que aquelas atividades e registros estejam devidamente documentados e que estejam em conformidade com as diretrizes da empresa, bem como, apresentar parecer ao corpo diretivo e acionistas do resultado alcançado com suas respectivas recomendações.
Tipos de Auditoria (Interna e Externa):
Externa é aquela auditoria focada nas Demonstrações Financeiras de uma determinada Organização e, naturalmente, implicando na análise de tudo que as rodeia, como os princípios contábeis, os de controle interno; aderências as normas e procedimentos; aderência as legislações e etc. É obrigatória para todas as empresas de capital aberto e tem que ser realizada por profissionais com formação em Contabilidade.
Interna é aquela focada na avaliação dos procedimentos internos utilizados por uma Organização, na qualidade e aderência dos sistemas de controle interno (Governança e Compliance), com o objetivo de identificar eventuais desvios e fraquezas nas atividades desenvolvidas. Não é obrigatória, poder ser utilizada por qualquer organização e pode ser realizada por qualquer profissional da organização que detenha conhecimentos para tanto e de preferência com formação acadêmica em uma dessas cadeiras: Contabilidade; Administração; Economia; Direito ou Engenharia.
No caso dos Condomínios, vamos nos deparar com um fato misto, ou seja, a Auditoria a ser realizada está mais para o conceito da Auditoria Interna do que da Externa, mas que será na sua maioria das vezes realizada por profissionais externos à organização, sejam independentes ou empresas especializadas.
Vale ressaltar, que não há necessidade da contratação de empresas de Auditoria Externa uma vez que não temos no condomínio a figura de balanços contábeis, obrigados a seguir os Princípios Contábeis Geralmente Aceitos, nem tampouco ter seus demonstrativos assinados por um contador.
Em um Condomínio o que temos são relatórios gerenciais que registram as atividades que foram realizadas sem, no entanto, ter as características e regras legais de um Balanço Contábil, e que podem ser elaborados de diversas formas diferentes. Naturalmente, sempre seguindo determinados procedimentos legais, principalmente aqueles voltados aos aspectos tributários e de Recursos Humanos (Folha de pagamento).
Nesse tipo de relatórios o que se avalia são as aderências as legalidades dos fatos. Se aquela despesa realizada está devidamente formalizada, se o seu fato gerador realmente existiu (uma compra ou uma contratação) e se, quando pertinente, seus respectivos impostos foram recolhidos. No caso das receitas, se os rateios foram adequadamente aplicados, os depósitos efetivados e as cobranças realizadas. Ou seja, estamos falando de um trabalho típico de Auditoria Interna (vem definição acima). Agora que já conhecemos os conceitos e tipos de auditoria e qual seria a mais adequada para atuar num Condomínio vamos tratar a questão da sua contratação, quem pode contratar um serviço de auditoria?
Quem pode contratar um serviço de auditoria?
Dentro da organização Condomínio qualquer um de seus integrantes pode contratar um serviço de auditoria, naturalmente que respeitando aquelas questões básicas e regimentais. A questão básica não é exatamente quem pode contratar, mas sim o motivo de estar sendo contratado aquele serviço de auditoria, sendo assim podemos exemplificar algumas situações:
Quando contratada pelo Síndico: aqui caberia a necessidade de uma avaliação do trabalho que vem sendo executado pela Administradora voltado, por exemplo, para aquelas questões mais técnicas como: recolhimento de impostos; taxas e encargos;
Quando contratada pelo Conselho Fiscal: aqui caberia a necessidade de uma avaliação do trabalho que vem sendo realizado tanto pelo Síndico quanto pela Administradora, principalmente se o Conselho estiver formado por condôminos com pouca ou sem nenhuma experiência em administração, o que é muito comum;
Quando contratado por decisão de uma Assembleia: aqui temos basicamente duas situações. A primeira para que seja feita uma avaliação nos sistemas de gestão do Condomínio como um todo direcionada para as questões de controle interno e aderência regimental. A segunda para que seja feita uma auditoria numa determinada gestão e aqui envolvendo todo o grupo que participa do processo de gestão: Síndico – Conselho – Administradora, e eventualmente até escritórios de cobrança.
De qualquer forma, e seja pelo motivo que for recomendo que sempre o assunto da contratação de uma auditoria seja levado para a aprovação assemblear.
Em uma avaliação de riscos a ser considerada para a contratação dos serviços de uma auditora destacamos a seguir as principais irregularidades possíveis de serem praticadas num Condomínio:
- Apropriação indébita feita através de pagamento de despesas “frias” que de fato não foram realizadas e que estão formalizadas com documentos falsos;
- Lapping – encobrimento de falta de caixa por meio de atrasos seriados de lançamentos de recebimentos, comum quando da existência de contas pool;
- Superfaturamento, compras e ou contratações realizadas por um valor bem superior ao real, formalizadas com documentos frios, recibos na maioria das vezes;
- Gastos não aprovados ou bem acima do que foi aprovado na previsão orçamentária;
- Apropriação indébita de pagamento de cotas em atraso, que não são devidamente registradas e acompanhadas mês a mês;
- Apropriação indébita da sobra de arrecadação feita para pagamento de conta de água, quando a medição é individualizada.
Além, é claro, daquelas irregularidades voltadas para a operação do dia a dia do Condomínio, tais como: falta de manutenção de itens críticos (elevadores; gerador; etc.); falta/falha no sistema de segurança; desídia na gestão de pessoal e etc.
Uma vez identificadas irregularidades, o que fazer? Considerando que o resultado do trabalho da auditoria só recomenda e para por aí.
Na minha opinião, seja da responsabilidade de quem quer que seja, a prática das irregularidades apontadas por uma auditoria, a melhor decisão a ser tomada, pela Assembleia, é a contratação de um bom advogado que via de regra irá conduzir o assunto através da formalização de um bom acordo ou dependendo da gravidade junto as autoridades competentes. Em momento algum nem o corpo diretivo nem a Assembleia deverão tomar qualquer decisão junto aos possíveis responsáveis, evitando assim questões de ação contrária de calúnia, difamação e injúria além de danos morais e etc.
Conclusão
Concluindo sobre o tema Auditoria em Condomínio, finalizo dizendo que podemos e ou devemos contratar uma auditoria para agir preventivamente, neste caso com a realização de trabalhos continuados que poderão ser mensais, trimestrais e etc., ou agir de forma investigativa, pontual para a apuração da pratica de eventuais irregularidades e sempre com a aprovação assemblear.
Cabe destacar, também, que é importante entender qual de fato é a necessidade do Condomínio, porque em muitas das vezes o que é necessário é a contratação de uma Consultoria Especializada para auxiliar no estabelecimento de boas práticas administrativas envolvendo a criação de processos formalizados e treinamentos que podem abranger não só os colaboradores do Condomínio mas também o Síndico e Conselheiros.
Se você tem alguma dúvida sobre o tema? Deixe seu comentário aqui embaixo!